terça-feira, 4 de março de 2008

Lixão criado pela prefeitura causa brigas e poluição

Por Rafael Duarte - Repórter
Lixão gera polêmica e reforça denúncias de poluição em afluente do rio Curimataú
Um lixão criado pela prefeitura de Montanhas na região rural do município tem aterrado açudes e causado brigas entre proprietários de terrenos vizinhos e catadores de lixo da cidade que usam o espaço, de aproximadamente dois hectares, para depositar entulhos e lixo - inclusive do hospital do município.
Semana passada, a TRIBUNA DO NORTE recebeu a denúncia do pedreiro Genival Gomes Barbosa, 60 anos, que possui um terreno ao lado do lixão, e, no sábado, foi constatar o problema no município. Embora menor, a cena lembra o antigo lixão de Cidade Nova, que recebeu durante muitos anos a maior parte do lixo de Natal. Em alguns momentos, as moscas e a fumaça provocada pelo fogo em determinadas áreas do terreno impedia o acesso a todos os pontos do espaço.
A estrada que liga o centro urbano de Montanhas ao lixão é de barro, corta vários terrenos e segue até o rio Curimataú, usado pela população para consumo de água e lazer. Enquanto a reportagem esteve no local, a caminhonete de um catador e um caminhão da prefeitura despejaram entulho e lixo no terreno. Indagado se o material depositado vinha do município, um funcionário fardado disse apenas que sim. Nos fundos do lixão, colado na cerca que separa a área do terreno do agricultor Manoel Monteiro da Luz há uma cabana de madeira, papelão e lona. Nela, mora uma família que, segundo Genival Barbosa, vive do material despejado no local. No entanto, nenhum morador foi encontrado para falar sobre o assunto.
O pedreiro conta que o terreno do lixão pertence ao marido da prefeita de Montanhas, Otêmia Maria de Lima e Silva, que teria alugado a área à prefeitura. O riacho que cortava os terrenos de Genival e do lixão, está, hoje, aterrado com entulhos, pedras e areia. Na área que pertence ao pedreiro, a cor verde da água rasa denuncia que o que sobrou está tomado pelo lodo e o lixo. Vidros de remédio foram encontrados no local. Segundo Genival, até seringa e agulhas, vindas do hospital, são despejadas na região. Ele reclama que foi obrigado a levar as poucas cabeças de gado que possui para o terreno do vizinho Manoel Monteiro sob pena de perder a criação. “Se deixasse aqui, o gado ia morrer. Essa água não pode ser consumida. E vai tudo para o rio Curimataú. Eles despejam até lixo do hospital aqui. É porque já pegou fogo em muita coisa, mas você encontra seringa, agulha, tudo material perigoso do hospital. Além de todo o lixo da cidade. Ontem (sexta-feira passada) o último carro da prefeitura veio despejar lixo às 10 horas da noite”, conta o pedreiro que mora desde 1968 no Rio de Janeiro, mas voltou há um ano para Montanhas por medo de perder o terreno comprado, por R$ 14 mil, com dinheiro do trabalho no Rio. “Me diga quem é que vai querer comprar um terreno aqui, com um lixo desse?” questiona em tom de desabafo.
O caso já foi denunciado por Genival Barbosa à Promotoria de Nova Cruz, onde funciona a comarca de Montanhas, ao Idema/RN e ao Ibama. Mas até o momento nenhuma medida foi tomada.
MP aguarda laudo para ajuizar Ação
A Promotoria pública de Nova Cruz, que também abrange a comarca de Montanhas, aguarda o laudo oficial do Idema/RN para ajuizar uma ação contra o município e obrigar a prefeitura a dar um destino correto ao lixo da cidade. De acordo com o promotor do Meio Ambiente responsável pelo caso, Pedro Lopes, a denúncia chegou ao Ministério Público, pela primeira vez, no final do ano passado. Desde então, ele cobra uma posição do Idema. “Já instaurei um procedimento administrativo, pedi ao Idema a fiscalização e autuação do município, mas até agora não recebemos nada. Agora em fevereiro, recebemos uma nova denúncia e requisitei novamente o Idema. Estamos esperando para ajuizar um processo e obrigar a prefeitura a dar uma boa destinação ao lixo”, afirmou.
O promotor disse ainda que não pretende ouvir a prefeitura para tomar as medidas em relação ao caso. Para ele, o que interessa, agora, é a prova. “Não preciso ouvir ninguém da prefeitura. Até porque se convocar a prefeita, ela vai negar. Eu quero a prova, e isso é o Idema quem vai me dar”, disse. Pedro Lopes afirmou que outros processos correm, na Justiça, contra a administração da prefeita Otêmia Maria Lima e Silva. Segundo ele, um imóvel que estaria em nome do genro da prefeita teria sido alugado à prefeitura e, hoje, funciona como sede de duas secretarias públicas: de ação social e de educação. A irregularidade, conta o promotor, implicaria em crime de improbidade administrativa. “Já existe um processo na Promotoria pública de Nova Cruz, em fase de julgamento, em que o marido da prefeita, conhecido como Nino Januário, alugou um prédio para a prefeitura. O imóvel está no nome de um genro dele. Isso é público, a instrução do processo, inclusive, já foi concluída”, afirmou.
Prefeitura não tem dinheiro para fazer aterro sanitário
A prefeitura de Montanhas não tem como resolver a situação a curto prazo. Para isso, segundo o advogado do município, José Moraes, seria necessária a construção de um aterro sanitário, orçado em R$ 40 mil. Indagado sobre o problema, ele afirmou que, à princípio, a prefeitura deve trabalhar com soluções paliativas. “O que vai resolver essa situação é um aterro sanitário, mas custa R$ 40 mil e a prefeitura não tem recurso para atender nesse sentido, a não ser que venha verba da União. Mas já estamos vendo um jeito de queimar o lixo e fazer barreiras para que não se alastre e prejudique a população”, afirmou.
Informado pela reportagem sobre a presença de lixo tóxico hospitalar, Moraes afirmou que não sabia. “Vou ver sobre isso aí porque não sabia de lixo de hospital, pensei que fosse apenas plástico, normal”, disse surpreso. Segundo ele, o terreno onde o lixo da cidade é despejado pertence à prefeita Otêmia Maria de Lima e Silva. Moraes contou ainda que, “há vários anos”, antes de despejar o lixo na região rural do município, o depósito da prefeitura ficava próximo a um trecho da rodovia estadual localizado na divisa com o município de Pedro Velho. “Todas as regiões próximas daqui tem problema com relação ao despejo de lixo. Em Montanhas, há vários anos, se depositava o lixo na pista, próximo à divisa com Pedro Velho. Até que alguém viu e a prefeitura de Pedro Velho mandou um ofício pedindo para que depositássemos o lixo em outro lugar”, afirmou.
Prefeitura não tem licença ambiental
O Instituto de Defesa do Meio Ambiente (IDEMA/RN) informou através de sua assessoria de comunicação que a prefeitura de Montanhas não possui licença ambiental para criar um lixão na cidade. Uma equipe técnica do órgão esteve semana passada no município e constatou entre outras irregularidades, o despejo de lixo orgânico misturado a lixo tóxico hospitalar.
O Idema deve apresentar um laudo oficial hoje ou amanhã sobre o caso. A prefeitura será notificada e terá 15 dias para retirar o lixo tóxico do local. “O laudo deve sair ainda esta semana, mas já se sabe que a prefeitura não possui licenciamento ambiental para a atividade. Eles terão 15 dias para dar fim ao lixo hospitalar pelo risco de contaminação e um tempo maior para retirar o lixo orgânico, até porque eles não têm um lugar para colocá-lo. As maiores reclamações das prefeituras são, inclusive, em relação à falta de recursos para construir áreas que possam comportar o lixo da cidade”, afirmou a assessoria.
FONTE: Tribuna do Norte - 04/03/2008