sábado, 25 de julho de 2009

Decreto municipal põe em risco plano diretor

O decreto permite que prédios que seriam apart-hotéis se transformem em prédios residenciais

Divulgada como socorro ao setor imobiliário, a possibilidade de mudança de tipologia de empreendimento não-residencial para residencial, decretada pela Prefeitura no início de abril, representa na verdade um grande perigo ao meio ambiente, segundo atesta a pesquisadora da UFRN, Rosa Pinheiro, em recente pesquisa sobre o assunto.
O aumento da densidade, ou seja o número de pessoas por área, é um dos principais problemas. A questão, de acordo com Rosa Pinheiro, já chegou ao conhecimento do Ministério Público, que pretende utilizar a pesquisa como embasamento para futura avaliação.
A mudança de tipologia significa o seguinte: o empreendedor pode modificar o tipo do projeto, de não-residencial para residencial, após o licenciamento já ter sido concluído. A ideia da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente era incentivar o setor imobiliário, que havia sido pego de calças curtas pela crise financeira. Com a ausência de investimentos estrangeiros, uma série de Apart-hotéis já aprovados pela Semurb teriam de ser paralisado porque não havia mais interesse comercial nos mesmos. Ao mesmo tempo, o Governo Federal iniciava uma série de incentivos para a construção e aquisição de casas e apartamentos. A mudança de tipologia veio com essa intenção: segurar os empregos de uma das mais vigorosas atividades econômicas do Estado. Desde o decreto foram realizadas 50 pedidos na Semurb a esse respeito, segundo informações da própria Secretaria.
Contudo, a diferença de tipologias (residencial e não-residencial) traz também mudanças significativas para o Plano Diretor. Como se sabe, o Plano Diretor limita os empreendimentos, dependendo da área a ser construída. Para as áreas com mais infra-estrutura, como saneamento, drenagem e vias públicas, pode-se construir mais e com maior densidade. Para as áreas em essa estrutura, a capacidade de ocupação é bem baixa.
Vejamos: o que concentra um maior número de pessoas, um apart-hotel ou um apartamento? A segunda opção, é claro. Em um hotel, ou apart-hotel, as pessoas “moram” apenas provisoriamente enquanto que no segundo a residência é fixa. Logo, um apartamento demanda uma maior infra-estrutura para abrigar seus moradores. Dessa forma, quando um empreendimento é modificado, de apart-hotel para apartamento, a densidade de ocupação (o número de pessoas que irão morar naquela área, aumentando a necessidade de saneamento, drenagem, etc) fica maior. Com a possibilidade de se mudar a tipologia ou o uso do empreendimento, áreas que não estão preparadas para receber um grande número de moradias e pessoas passam a abrigar essa demanda. E os resultados disso podem ser catastróficos.
A pesquisadora Rosa Pinheiro exemplifica os problemas que a ocupação desordenada da cidade acarretam com o caso das águas subterrâneas de Natal. “Desde a década de 60 que se sabe que a água de Natal está concentrada nos lençóis freáticos. Quando se ocupa o terreno sem o devido saneamento, estamos na verdade jogando esse esgoto no solo e poluindo as reservas de água”, diz.

Decreto municipal institui desvio de uso

De acordo com o que a pesquisadora Rosa Pinheiro constatou, essa espécie de desvio de uso, ou mudança de tipo, já acontecia antes do decreto. “O decreto na verdade oficializou uma prática que já existia, que não é ilegal, mas que constitui um desvio de uso”, explica Rosa Pinheiro. Desde antes, os empreendimentos eram licenciados como Apart-hotel, mas funcionavam como apartamentos residenciais.
Um levantamento feito pela pesquisadora mostra uma disparidade entre o número de Apart-hotéis licenciados e o número de Apart-hotéis existentes na realidade. Rosa Pinheiro identificou 16 Apart-hotéis funcionando e 183 licenciados, sendo 146 apenas em Ponta Negra, uma área da cidade carente de infra-estrutura e também a menina dos olhos do mercado imobiliário. “A lei permite, de certa forma, esse tipo de coisa, mas é um desvio de uso. Imagine que um conjunto de cinco apartamentos pode equivaler a um conjunto habitacional de porte pequeno. E tudo isso desaguando na rede de esgotos já deficitária e ineficiente de um bairro como Ponta Negra”, afirma.Como parâmetro para analisar a questão, a pesquisadora Rosa Pinheiro cita o início do desenvolvimento de Natal. As áreas de Petrópolis, Tirol e Alecrim, por exemplo, foram planejadas. No entanto, entre o ano de 1935 e fins da década de 60, nenhum plano de desenvolvimento urbano foi viabilizado, gerando um crescimento desordenado. Essas duas palavras, “crescimento desordenado”, também significam: degradação ambiental, falta de saneamento, etc. “O poder público não pode se ausentar do posto de mediador entre o interesse do mercado e o interesse da sociedade”.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE tentou entrar em contato com a Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, mas o secretário Kalazans Bezerra havia saído e o celular do chefe da assistência técnica, Edilson Lopes, desligado.
Fonte: 25/07/2009 - Tribuna do Norte

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Esgotamento sanitário é necessário no RN

O desconhecimento da importância do esgotamento sanitário para o meio ambiente e saúde pública pela população é um dos entraves para a expansão da rede de esgoto. Calcula-se que, no Rio Grande do Norte, entre 10% e 15% da população atendida por esgoto é resistente a fazer este tipo de ligação.

A Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (CAERN) vem trabalhando sistematicamente as áreas onde este tipo de problema se apresenta e, com trabalhos de conscientização ambiental, consegue reverter a situação.

Atualmente, em todo o Rio Grande do Norte, são cerca de 107 mil ligações de esgotos ativas. “A Caern tem trabalhado para aumentar o índice de ligações com obras em todo o Estado, investindo mais de R$ 650 milhões em obras de esgotamento sanitário e abastecimento de água”, destaca o presidente da Companhia, Walter Gasi.

Segundo ele, somente em esgotamento sanitário, estão sendo investidos no interior R$ 219 milhões em municípios como Mossoró, Macaíba, São José de Mipibu, Canguaretama, Nova Cruz, Goianinha, Assu, Angicos e Pendências.

Existem dois tipos de implantação de sistema de esgoto. O primeiro é o convencional, que é implantado nas vias públicas, fora dos lotes particulares. Neste modelo, os moradores precisam fazer as ligações das áreas de sua casa onde é despejada água servida, como banheiros e cozinhas, para a rede coletora que passa na rua. Já no sistema condominial, que atende usuários de baixa renda, os canos do esgoto passam pelos quintais das residências. No condominial, a tarifa paga pelo esgoto também é menor em 50% do que a convencional.

A resistência às ligações de esgoto ocorre porque, na maior parte das vezes, pelo sistema convencional, os moradores têm que fazer uma espécie de reforma em suas residências, para passar os canos de coleta de esgoto. E, independente do grau de instrução ou faixa de renda, as pessoas não querem arcar com o custo desta despesa.

De acordo com o gerente da Regional Natal Sul da Caern, Lamarcos Teixeira, a justificativa para não fazer a ligação de esgoto é, em primeiro lugar, econômica, e em segundo, por desconhecimento da importância do esgotamento sanitário para o meio ambiente e para a saúde pública.


Fonte: 19/07/2009 - Tribuna do Norte

domingo, 19 de julho de 2009

O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons.”

Martin Luther King Júnior.


Esta frase eu lí no Blog Cidadania Plena de meu amigo Kalazans Bezerra, hoje Secretario de Meio Ambiente e Urbanismo da cidade do Natal, posto pesado e que Kalazans carrega com muita força e valentia, já tendo promovido diversas mudanças extremamente significativas e salutares para todos, tanto é que a cidade em peso reconhece os ótimos préstimos deste nosso querido amigo.


Faço questão de aqui reproduzir esta frase, não apenas pela carga semântica de suas sábias palavras, mas sim por quem às reuniu nesta frase.


Dedico esta frase à todos os homens bons de espírito, que acreditam que podem fazer a diferença e ajudar a mudar nosso mundo a partir de nosso lugar, e que silenciosamente vão ganhando espaço num silencioso GRITO pela liberdade, pela fraternidade e igualdade entre todos.


Dedico esta frase a meu amigo Kalazans Bezerra, pedindo-lhe que sempre se lembre de onde veio, de qual é o seu mundo real, de sua biografia tão bela e respeitada, não permitindo jamais que as forças contrárias a Ética, a verdade, legalidade e moralidade lhe atinjam ou lhe façam balançar sobre suas próprias pernas.


Que siga assim, sempre trilhando o rumo dos principios constitucionais da moralidade, legalidade e impessoalidade que o serviço público tanto prega, e que tanto tem faltado nos últimos anos.

Por fim, faço minhas as palavras de Lina Vieira em recente entrevista a Tribuna do Norte, neste blog reproduzida na integra:


"
É da natureza dos cargos de confiança a exoneração a qualquer tempo. Diante de tudo isso, minha mente está quieta, a espinha ereta e o coração tranqüilo, lembrando um compositor maior. Nossos princípios estão intactos; nossos valores incólumes".


Abraços a todos.

Gustavo Szilagyi

Lina Vieira: “Sinto-me como uma otária”

Caros amigos. Abro espaço aqui no Blog Grito-Verde para reproduzir a entrevista concedita por Lina Vieira à Tribuna do Norte de 18 de julho de 2009. Faço isso como homenagem a esta honrada mulher e servidora pública das mais competentes que já pude conhecer.

Não é apenas pelo fato de ser Potiguar, mas sim pelo que ela representa para o Serviço Público deste país, sobretudo para orgãos de fiscalização, como é o caso da Receita Federal.

Abraços;


Gustavo Szilagyi


Então secretária da Receita Federal, Lina Vieira foi demitida por Guido Mantega por focar sua gestão nos grandes contribuintes


Demitida pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, por ter focado sua gestão nos grandes contribuintes, como Petrobras, bancos e indústrias, a ex-secretária da Receita Federal do Brasil, Lina Maria Vieira, se sente, como todo brasileiro que paga em dia seus impostos, “uma otária”. Lina diz que “a concessão de parcelamentos a cada dois/três anos, sempre com condições cada vez mais favoráveis ao mau pagador, transforma o contribuinte adimplente no otário que acreditou no sistema. A MP 449 coroou o mau contribuinte e deixou para futuros otários a conta da crise”. Com 33 anos no serviço público, mãe de três filhos e casada com o empresário Alexandre Firmino, a ex-secretária disse que, “lamentavelmente, nos tempos de hoje, é difícil ser honesto em qualquer campo de atuação. Vejo com apreensão os exemplos que os jovens estão recebendo: pessoas que amealharam fortunas por meio da corrupção são elogiadas pela “sabedoria”, dizem que são sujeitos “espertos” e a sociedade não apresenta para essas pessoas nenhum tipo de recriminação ou punição”. Lina nega que tenha sido assediada para permitir facilidades. “Desde o início deixei claro que os princípios da legalidade e da impessoalidade seriam o esteio da minha gestão. Não deixei espaço para esse tipo de assédio.”

Entrevista

Lina Vieira - Ex-secretária da Receita Federal

Quem é Lina Maria Vieira?

Mineira de nascimento e norte-rio-grandense por opção e por título de cidadã concedido pela Assembleia Legislativa. Mãe de três filhos maravilhosos, Rodrigo, Bruno e Renata. Servidora pública federal, com 33 anos de serviços prestados à Nação. Uma pessoa que adora o seu trabalho e é intransigente com sonegadores e pessoas antiéticas.


É difícil ser honesto no serviço público, principalmente num cargo de destaque como o que senhora ocupou até esta semana?

Lamentavelmente, nos tempos de hoje, é difícil ser honesto em qualquer campo de atuação. Vejo com apreensão os exemplos que os jovens estão recebendo: pessoas que amealharam fortunas por meio da corrupção são elogiadas pela “sabedoria”, dizem que são sujeitos “espertos” e a sociedade não apresenta para essas pessoas nenhum tipo de recriminação ou punição. Se a justiça não as pegou, acho que a sociedade devia discriminá-las, repudiá-las mesmo, fazê-las sentir que são pessoas que não merecem respeito.

Quais os maiores entraves que a senhora enfrentou para realizar seu trabalho na Receita Federal?

Encontrei a Receita com muitos problemas, principalmente em função da fusão da Ex-SRP com a Ex-SRF: o atendimento estava um caos (um grande desrespeito ao cidadão contribuinte), os sistemas informatizados daquelas Secretarias não se comunicavam e as pessoas não estavam integradas (foram esquecidas no processo), apenas para ficar nos principais entraves da fusão. Além disso, as nossas fronteiras terrestres estavam abandonadas, a aduana fragilizada, as pessoas desmotivadas, a fiscalização engessada e superficial, o parque tecnológico sucateado e havia uma péssima relação com as administrações tributárias de Estados e Municípios.

O filósofo político florentino, Nicolau Maquiavel, até bem pouco tempo associado ao mal e recentemente reabilitado ao ponto de hoje ser estudado nos cursos de MBAs, dizia que “deve-se ter em conta que não há coisa mais difícil de realizar, nem de êxito mais duvidoso, nem de maior perigo para conduzir, do que o estabelecimento de grandes inovações”.
Adotamos alguns princípios direcionadores considerando a RFB como uma organização nacional:

- Mudamos a estrutura do órgão central (decisões centralizadas no gestor máximo do órgão- reduzimos de 57 para 19 as unidades vinculadas ao gabinete);

- A melhoria do atendimento ao cidadão, com a quebra de paradigmas de que em nome da segurança do sistema as coisas só poderiam acontecer com certificação digital. Hoje o cidadão tem conhecimento de todas as suas informações fiscais e cadastrais através do acesso por senha e pode auto-regularizar suas pendências pela internet, sem enfrentar filas. Até o mês de outubro será disponibilizado ao cidadão o agendamento, para que tenha dia e hora para ser atendido nos CAC;

- Demos maior transparência aos números da arrecadação, da carga tributária e das fiscalizações;
- Criamos uma coordenação de integração com as administrações tributárias estaduais e municipais para em conjunto e disponibilizando e cruzando informações combater o crime organizado (contrabando, sonegação, descaminho, fraude etc);

- Ampliamos a capacidade de análise da política tributária firmando convênios com o IPEA, Universidades, CNPq, Institutos de pesquisa e cooperação Interinstitucional com o Ministério Público, Polícia Federal, Tribunal de Contas da União, Forças Armadas;
- Integramos a RFB ao macroprocesso do crédito tributário que dará maior agilidade na tramitação processual, solução dos litígios e execução do crédito tributário;
- Implantamos o Planejamento Estratégico da RFB e estruturamos o Escritório de Projetos Estratégicos;

- Reformulamos a página da RFB na internet, com ênfase na prestação de serviços;
- Incluímos o módulo de Contribuição Previdenciária no Sistema PERDCOMP;

- Mudamos as normas relativas as obras de construção civil;

- Melhoramos o acesso aos sistemas da Previdência.

- Na área de valorização das pessoas que integram a RFB instituímos o acesso aos cargos de confiança por meio do Processo Seletivo Interno -PSI que considera o mérito e não “quem indica”, afastando qualquer ingerência política na escolha dos Delegados e Inspetores; Instituímos o Quadro de vagas, o Banco de Talentos e o Painel de Intenção de Mobilidade, com a introdução de política permanente de movimentação do servidor público;
- Elaboramos a minuta de edital e demais procedimentos para a realização do Concurso Externo para Auditores e Analistas;

- Concluímos os estudos preliminares de lotação e do Plano de lotação;
- Concluímos, também, o módulo de gestão de mercadorias apreendidas – banco de necessidades, gerenciamento de capacidade de depósitos, administração eletrônica e infraestrutura de armazenagem, o Banco de Mercadorias Apreendidas e o Leilão Eletrônico que, em breve serão lançados;

- Mudamos o foco da fiscalização, que antes era na quantidade de ações fiscais e superficial, ou seja, os esforços da fiscalização estavam direcionados aos contribuintes de menor capacidade econômica, à realização de procedimentos fiscais menos complexos e voltados aos exercícios mais antigos, o que gerava uma série de resultados inócuos, como lançamentos em empresas já encerradas, cujo crédito tributário é de difícil recuperação. Intimamos as 10 mil maiores empresas dopais quase que simultaneamente, a apresentarem a sua contabilidade em meio digital, fato inédito e que representa uma mudança de paradigma atual, pois, além de focar a atuação fiscal nas empresas de grande capacidade econômica, haja vista que as referidas empresas representam 70% da arrecadação, foram solicitados os arquivos dos anos de 2007 e 2008 e, como disse, aproximando a fiscalização do fato gerador.
No novo modelo introduzido para a fiscalização passou-se a focar a qualidade, profundidade, proximidade ao fato gerador e efetividade do lançamento. Já no segundo semestre deste ano iniciaremos as fiscalizações dos fatos geradores de 2008, fato que aumentará o risco e, com certeza, repercutirá na arrecadação espontânea; Introduzimos o acompanhamento e análise dos setores econômicos e grandes grupos empresariais e aumentamos os procedimentos fiscais nos contribuintes de maior capacidade econômica. Até junho/2009 foram constituídos créditos tributários na fiscalização no valor de R$ 35.78.107.041,00, considerando os encerrados parcialmente;

- Criamos uma divisão para acompanhamento de pessoas físicas de alta renda e a malha Pessoa Jurídica;

Na Portaria de metas de fiscalizações de 2009 quebramos o engessamento das metas, passamos a utilizar novas ferramentas para a seleção de contribuintes a serem fiscalizados;
- Fortalecemos as Delegacias Especiais de Instituições Financeiras (DEINF) e a Delegacia Especial de Assuntos Internacionais aumentando o número de auditores (ex. de 15 para 70 auditores na DEINF), selecionados por meio de processo seletivo interno (PSI);
Voltamos a força da fiscalização para os grandes contribuintes e os números respondem por essa mudança de foco: no1º semestre de 2008 a fiscalização lançou, aproximadamente R$ 800 milhões em autos de infração nas Instituições Financeiras e no mesmo período de 2009 foram quase R$ 5 bi (R$ 4.774.425.673,00).


A senhora foi muito assediada por grandes devedores pedindo facilidades?
Desde o início deixei claro que os princípios da legalidade e da impessoalidade seriam o esteio da minha gestão. Não deixei espaço para esse tipo de assédio.


A senhora disse que o contribuinte que paga compulsoriamente seu imposto se sente “um otário” quando vê os grandes sonegadores triunfarem. A senhora se sente assim?

Sim. A concessão de parcelamentos a cada dois/três anos, sempre com condições cada vez mais favoráveis ao mau pagador, transforma o contribuinte adimplente no otário que acreditou no sistema. A MP 449 coroou o mau contribuinte e deixou para futuros otários a conta da crise.

Quanto custa a sonegação fiscal ao bolso do contribuinte?

Não há estimativas precisas no Brasil. A falta de transparência nas informações da RFB impossibilitava a realização de estudos acadêmicos sobre a questão. Para tentar corrigir essa deficiência, fizemos um convênio com o IPEA, que já está produzindo bons frutos. O primeiro resultado dessa parceria foi a análise da carga tributária de 2008.

Se sente frustrada e/ou magoada com a forma como foi demitida?

Não. É da natureza dos cargos de confiança a exoneração a qualquer tempo.
Diante de tudo isso, minha mente está quieta, a espinha ereta e o coração tranqüilo, lembrando um compositor maior. Nossos princípios estão intactos; nossos valores incólumes.

Qual a maior lição que a senhora tira como gestora pública?

Que a gestão pública deve ser menos corporativa e mais republicana; menos autoritária e mais participativa; menos autocrática e mais democrática; menos centralizadora e absorvente; mais capilarizada e descentralizada.

O dinheiro arrecadado com o imposto é mal empregado?

Na década de noventa a carga tributária cresceu mais de 8 pontos percentuais, atingindo 33% do PIB. Desse montante, 6 pontos percentuais foram para sustentar a política monetária, que pagou juros altíssimos para o andar de cima. Sem dúvida, essa é uma péssima aplicação do imposto arrecadado.

Por que a mudança de regime fiscal, feita pela Petrobras, foi considerada ilegal pela Receita Federal?

A RFB não se manifesta publicamente sobre conduta e/ou situação fiscal de contribuintes especificamente; o sigilo fiscal nos proíbe. Apenas nos manifestamos sobre setores econômicos e sobre legislação. A esse respeito divulgamos nota nos limitando a reproduzir esclarecimentos sobre o sistema de compensação que se encontra no sítio da RFB: WWW.receita.fazenda.gov.br/perguntao/dipj2009/CapituloVIII-LucroOperacional2009.pdf, pergunta 144.

Como motivo oficial da sua demissão, o governo tem divulgado a queda na arrecadação, pelo oitavo mês consecutivo. Que análise a senhora faz dessa tendência negativa?

Tentou-se criar essa imagem há alguns dias antes de minha saída, mas isso foi desmitificado, tanto é que, na Nota Oficial do Ministério da Fazenda não há nenhuma referência a queda de arrecadação. A própria imprensa deixou de lado essa abordagem, porque foi evidenciado que houve uma arrecadação atípica em 2008 decorrente da enxurrada de aberturas de capitais na Bolsas (as chamadas IPO), de modo que não se pode fazer comparação da arrecadação de 2009 com o ano anterior. Ademais, este ano foi e ainda está sendo um ano de crise econômica e o governo optou para o seu enfrentamento em desonerar setores importantes da economia (a desoneração no primeiro semestre foi de 13 bilhões de reais) e alargamento do prazo de pagamento dos tributos, sinalizando que a arrecadação pagaria a conta da crise para manutenção do emprego e renda.

Um outro motivo, apontado pela imprensa, foi que a Receita, sob sua gestão, teria endurecido com os bancos. O sistema bancário tem previlegios e/ou está mal acostumado com o tratamento que recebe da fiscalização tributária brasileira?
Não sei este foi um dos motivos para minha exoneração. Mas é fato que mudamos o foco da fiscalização, passando a priorizar os grandes setores, entre eles, logicamente, o financeiro. Pra se ter uma ideia, no primeiro semestre de 2008 a Receita autuou as instituições financeiras em 800 milhões; já o nosso trabalho no primeiro semestre de 2009 resultou em 4,8 bilhões de reais de autuações nesse setor.

A sua decisão de mudar o processo de provimento de cargos, escolhendo funcionários de carreira e com certa militância sindical para ocupar postos chaves na Receita, mexeu com interesses de grupos corporativos e também podem estar nas origens da sua demissão?

Certamente que não, pois as escolhas que fizemos foram baseadas unicamente na competência. Se algumas dessas pessoas foram ou são militantes sindicais, não vejo demérito algum; ao contrário, as entidades sindicais do Fisco Federal são extremamente respeitadas em todo pais. Veja o artigo de Élio Gaspari na Folha de São Paulo quando ele diz que: a) “a Unafisco, ao contrário do sindicato dos pipoqueiros, reúne servidores do estado que chegaram a receita por concurso público”; b) “deve-se reconhecer que foi a Unafisco que mordeu os calcanhares da quadrilha aninhada na cúpula da receita”. Hoje 95% da categoria é sindicalizado.


Fonte: 18/07/2009 - Tribuna do Norte