domingo, 7 de março de 2010

RN é o 5º colocado no desmatamento da caatinga no país

Mossoró está entre os vinte municípios do nordeste brasileiro que mais desmataram a caatinga entre os anos de 2002 e 2008. O resultado está no documento feito pelo Ministério do Meio Ambiente, com o título “Monitoramento dos Biomas Brasileiros – Caatinga”. O documento identifica que o Rio Grande do Norte ocupa a 5ª posição de desmatamentos (1.142 km² de caatinga devastada) entre os estados que compõem a região do bioma da caatinga, na liderança estão a Bahia e o Ceará, com 4.527 e 4.132 km², respectivamente.

Segundo o texto, o município de Mossoró possui 2.110 Km² de área de caatinga e já devastou 4,5% desse montante, o que representa uma área total de 95 km². A cidade ocupa a 16ª posição entre as 20. Do RN, apenas Mossoró e a cidade de Touros, no extremo leste do estado, estão na lista dos municípios que mais devastaram. Touros, que possui uma área de caatinga de 603 Km², devastou 14,9% desse espaço, representando 90 Km² de área.

De acordo com o levantamento, no período pesquisado, a caatinga teve 16,57 mil Km² desmatados, o que equivale a 2% da área total do bioma no Brasil. A extensão da caatinga no País, mapeada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) é de 826.411,23 Km². Desses, 45,39% não existem mais. Para o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, o número é muito alto. “Podemos dizer que equivale proporcionalmente à área desmatada na Amazônia, se considerarmos que essa região é cinco vezes maior que a caatinga”, disse, durante a apresentação dos dados, em Brasília.

Sob o aspecto local, o desmatamento da caatinga possui dois fatores preponderantes para o alto percentual do município de Mossoró, “a fiscalização inadequada do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) e do Ibama, associada ao grande número de assentamentos rurais dentro do município de Mossoró, contribui para esse fato”, explica Mairton França, gerente executivo do Meio Ambiente da Prefeitura de Mossoró, acrescentando que a deficiência dos dois órgãos, sendo o primeiro estadual e o segundo federal, em Mossoró torna o município vulnerável. Outro ponto não menos importante é a grande quantidade de assentamentos rurais que são estabelecidos na região, pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

A questão dos assentamentos do Incra ainda é mais grave. Segundo o promotor Jorge Cruz de Carvalho, já houve casos em que assentamentos rurais foram identificados sem a licença ambiental, que é expedida pelo Ibama e permite a ocupação da área. A fiscalização falha do Idema já motivou inclusive ação para que o órgão seja estruturado de forma adequada, a fim de dar prosseguimento as suas ações.


Sem estrutura


A falta de interesse dos governos, inclusive do próprio Ministério do Meio Ambiente, revela o desprezo que o bioma caatinga tem de uma forma geral, o que por conseqüência gera seu crescente desmatamento. “Nunca houve projetos sérios de reflorestamento da caatinga. Os governos sempre deram atenção em demasia à Mata Atlântica e Amazônia, em detrimento da caatinga e do cerrado. Além disso, não existem órgãos estruturados para fiscalização, não existe uma conscientização dos que vivem em assentamentos sobre os cuidados em preservar a mata nativa”, mostra o reitor Josivan Barbosa, da Universidade Federal Rural do Semi-árido (UFERSA).

O reitor acrescenta que, mesmo dispondo de tecnologia e conhecimento para o desenvolvimento sustentável da região e a preservação da caatinga, a Ufersa possui apenas um projeto desse tipo, feito em parceria com a Petrobras, que recupera áreas degradadas pela exploração petrolífera. A parceria da Petrobras, inclusive, é feita também com a Gerência de Meio Ambiente da Prefeitura de Mossoró, que fornece mudas nativas da caatinga para o reflorestamento da área.

Fonte: Tribuna do Norte, 07 de março de 2010

O calor que sufoca Natal

O calor que tem sufocado Natal desde o início do verão tem motivos que vão muito além do termômetro, que são bem mais complexos que a simples medição da temperatura do ar. Não é incomum ver alguém comparando o calor de localidades diferentes com a simples comparação: cidade “X” tem 32 C enquanto cidade “Y” tem 37 C. A cidade “Y” é mais quente, correto? Não necessariamente. Variáveis como a umidade e a circulação do ar também interferem. E a quantidade de árvores e de asfalto que uma cidade possui também é um fator determinante.

A temperatura média de Natal não sofreu grandes alterações nos últimos anos. Contudo, a sensação térmica é cada vez mais desconfortável e não precisa ser cientista para perceber. As evidências estão nas ruas. A ciência ao mesmo tempo tem motivos claros para acreditar que a falta de planejamento urbano e a cada vez menor cobertura vegetal na cidade são os principais responsáveis pela “onda de calor” que se abateu sobre Natal. De acordo com os professores de arquitetura Aldomar Pedrini e Eugênio Medeiros, a diminuição do número de árvores e a crescente impermeabilização do solo são os grandes vilões do desconfortável calor de Natal.

Além da temperatura, a circulação do ar – em termos mais leigos, a “brisa” - é um dos fatores mais importantes para dar mais conforto ambiental. A sabedoria popular sabe bem disso: ambientes arejados são mais agradáveis. Contudo, a regra não é absoluta. É claro que com um sol tão forte quanto o de Natal não há brisa que dê jeito. “Só uma ventania para espantar o calor em um ambiente que recebe uma carga de radiação térmica tão alta”, explica o professor Aldomar Pedrini, que trabalha com conforto ambiental. Nesses casos, o planejamento dos prédios e da própria cidade podem amenizar ou agravar a sensação de calor.

Não é difícil responder: onde faz mais calor, embaixo de uma árvore ou debaixo do sol? Caminhando sobre a grama ou no asfalto quente? Claro que as primeiras opções são mais aprazíveis. No caso de Natal, de acordo com o professor Aldomar Pedrini, a forma como os edifícios estão aglomerados favorecem a sensação de calor. “É preciso dar espaço para que o ar circule, mas como temos muitos bairros com grande concentração de prédios, o calor fica acumulado. Seria interessante que houvesse um espaço entre as construções, para que o ar possa ter por onde circular”, diz Aldomar. O Alecrim e a Cidade Alta são bons exemplos do que conta o professor.

Outra questão abordada é a crescente impermeabilização do solo. Como se sabe, um vegetal utiliza a energia do sol para realizar a fotossíntese. Dessa forma, ela não “transmite” o calor da mesma forma que o asfalto ou mesmo que uma rua feita de paralelepípedos. “Se no asfalto você nota uma temperatura de 80 C em determinados momentos, a copa de uma árvore teria uma temperatura um pouco mais alta que a temperatura do ar no mesmo momento”, compara. No caso do asfalto, a contribuição para o calor é ainda mais intensa por conta da cor. O asfalto é escuro e absorve e transmite mais calor. Quem tiver dúvidas a esse respeito é só sair à rua com uma camisa preta em pleno meio dia.

No que tange à cobertura vegetal, o professor Eugênio Medeiros afirma que não bastam as grandes áreas verdes de Natal – como é o caso do Parque das Dunas e outras Zonas de Proteção Ambiental. “Essas áreas não tem influência direta sobre outras áreas de Natal”, diz. Em outras palavras, a cobertura vegetal deve ser difusa, com árvores distribuídas pelos bairros. Eugênio, em sua tese de doutorado, fez uma contagem das árvores dos bairros de Tirol, Cidade Alta e Petrópolis. Eram 3.470 e hoje, segundo o professor, esse número é bem menor. Não há quantificação. “Estamos iniciando um programa de pós-graduação nessa área que pode dar início a essa quantificação, à análise de dados. Hoje só conseguimos qualificar o problema”, diz Aldomar. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE requisitou à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo informações acerca da porcentagem de cobertura vegetal da cidade, mas até o fechamento dessa edição, não houve resposta.

Modelos europeus prejudicam clima

Além de traçar um panorama do quadro geral, os professores Aldomar Pedrini e Eugênio Medeiros falaram sobre como adaptar um edifício para obter um maior conforto ambiental e ainda economizar energia. Entre os prédios de Natal, eles indicaram um que seria um modelo nesse sentido. O escolhido foi o prédio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), localizado no campus da UFRN. O projeto, segundo os professores, foi inclusive premiado por eficiência energética.

Em termos de arquitetura, o que prejudica a construção de edifícios mais confortáveis ambientalmente é a adoção de modelos europeus e norte-americanos. “O que funciona em um local não necessariamente funciona em outro. Não dá pra importar uma árvore da Suíça, que pode ser linda por lá, mas que em Natal não vai dar certo”, explica Eugênio Medeiros. Segundo Aldomar Pedrini, os edifícios com modelos importados têm janelas menores e menos espaços para circulação do vento.

O mesmo não acontece com o prédio do Inpe. Ele foi totalmente planejado para aproveitar o vento e a luz naturais. Ao mesmo tempo em que é mais confortável, o uso de energia é menor. Os materiais usados têm isolamento térmico e propiciam uma alta refletividade. Os locais mais iluminados não recebem a luz diretamente. “O sol não pega nos locais com aberturas, o que propicia uma iluminação mais macia”, conta.

Água

Mesmo sem entender de índices climáticos, nas ruas, a população não tem dúvidas do aumento da sensação de calor. E cada um tem a sua forma de conseguir driblar o desconforto.

É o caso do gari Ubiraci de Souza, de 47 anos. Trabalhando varrendo as ruas há três anos, ele aprendeu uma forma interessante de não se queimar com o sol quente: o uso de roupas com mangas compridas, além de luvas e chapéu. “Antes eu chegava em casa com os braços queimados”, conta. O problema da insolação está resolvido, mas não do calor excessivo. “É um absurdo o quanto fico suado trabalhando. Mas é isso mesmo, a gente que trabalha varrendo a rua tem que enfrentar o sol”, diz.

Shirlene de Sá protege o rosto da sua filha Maria Isabele, de apenas seis meses, com um pano. Ao mesmo tempo, usa protetor solar fator 60. “Não tem condições o calor que está fazendo. Ou o sol desceu ou a terra subiu”, reclama. O técnico em mineração Francisco Renan Mendes, de 58 anos, diz que o único antídoto é água. “Só tomando muito banho”, conta. Eles são unânimes ao dizer que a sensação de calor só tem subido.

Fonte: Tribuna do Norte, 07 de março de 2010