terça-feira, 24 de março de 2009

Meio ambiente sustentável urgente: Em defesa do Poço Feio

Por José Romero Araújo Cardoso

Marcado por estrutura geológica que remonta à era cretácea, o território dix-septiense possui privilegiadas formações espeleológica de origem calcária, sobressaindo-se a do Poço Feio, localizado na comunidade rural do sítio Bonito, imemorialmente ponto de turismo predatório que vem impactando consideravelmente todo entorno da caverna.

Água farta brota das entranhas da terra, a qual, sulcando o interior, tem provável gênese no emaranhado e complexo subsolo da região, formando intricado sistema do qual o arenito assú e o calcário jandaíra participam plenamente marcando a proeminência das características edáficas da bacia potiguar.

O Poço Feio precisa com urgência ser mapeado, pois nem nos registros da sociedade brasileira de espeleologia a cavernas e encontra catalogada. Ainda são incógnitas as ligações que o Poço Feio possui com o lençol freático e com a confusa profusão de túneis que marcam terrenos geológicos como o que está assentada a área geográfica do município de Governador Dix-sept Rosado.

Impossível pensar a dicotomia geográfica nos dias de hoje, razão pela qual intercalar o físico com o humano é imprescindível para que tenhamos respostas significativas sobre hipóteses levantadas.

Para gerações dix-septienses o Poço Feio vem se constituindo em lugar, contrário do que se verifica com a maioria que procura a caverna calcária para fins de lazer. Preocupações efetivas com a preservação e sustentabilidade irrisória, ambiental em sua essência, majoritárias no âmbito do pleno sentimento telúrico coma natureza, vem sendo exibida pela população local, sobretudo da comunidade rural do sítio Bonito.

A gestão pública deve se manifestar para que medidas urgentes sejam tomadas no sentido de buscar a harmonia entre respeito à natureza com geração de emprego e renda, tendo em vista que a base econômica de diversas comunidades espalhadas ao longo do percurso do rio Apodi Mossoró, em Governador Dix-sept Rosado, há tempos passados perderam o principal sustento, através da desestruturação dos plantios de alho e cebola, graças ao advento do mal-de-sete-voltas, ainda na década de oitenta do século passado.

Transformar a área do Poço Feio em pólo turístico sustentável é uma forma de garantir melhoria da qualidade de vida da população com racional intervenção antrópica no meio ambiente natural, extremamente impactado devido à retirada de rochas caclárias e outras originadas pelo tempo geológico, o qual vem transformando carapaças de animais marinhos em marga, gipsita, calcário e outros produtos fartamente utilizados na construção civil.

Impossível não se apaixonar pelo Poço Feio, a poesia que emana das águas, as lendas acalentadas e o curioso fenômeno hídrico que brota das entranhas da terra, caracterizado pela água em tonalidade azulada. Empiricamente, Luiz do Souza, do departamento de química da UERN, companheiro de viagens de reconhecimento e estudos à caverna calcária localizada em Governador Dix-sept Rosado, acha grande a probabilidade da proeminência de cobalto, além de outros componentes químicos ainda não alisados. O cientista notificou ainda que uma dúvida provavelmente havia sido respondida, com relação ao projeto encampado pela PETROBRAS, sobre análise das condições ambientais apresentadas pelo rio Apodi-Mossoró. Conforme Luiz di Souza, há grande chance da diferença obtida em água analisada no perímetro urbano de Governador Dix-sept Rosado ser devido à influência do vagalhão hídrico que brota da caverna calcária inundada, despejadas no curso da bacia à altura da comunidade rural do sítio Bonito.

Sujeiras, infelizmente, vem se acumulando ininterruptamente, dentro e fora do Poço Feio, completadas com a prática local de criar porcos de forma ultra-extensiva. Atentando contra o meio ambiente e contra a saúde pública, patrocinam desgastes ambientais em razão que os animais esperam melhores oportunidades para praticarem verdadeiros redemoinhos de lixo. As pessoas que vem de fora costumam deixar materiais orgânicos e inorgânicos em sacolas, logo rasgadas, sobretudo pelos suínos.

Necessário destacar ainda que o turismo predatório é de alto risco, pois sem a mínima infra-estrutura para comportar o fluxo de pessoas que acorrem ao Poço Feio, principalmente em finais de semana, despreza-se a possibilidade de rompimento de estalictites existentes na parte externa do afloramento calcário.

Pensando de forma sustentável a área correspondente ao Poço Feio, buscando aproveitar o potencial turístico do lugar, necessita-se urgentemente que haja correção ambientalmente legal dos perigos proporcionados pelos espeleotemas existentes na caverna calcária do Poço Feio. As fissuras são vistas de imediato, não apenas na área compreendida pela proeminência das estalactites, externamente, mas ainda em vários locais, com muitas pedras calcárias soltas, as quais podem provocar graves acidentes.

A natureza impactada de forma extrema não pode e nem consegue mais esperar. A maioria das pessoas que habita o planeta não acordou ainda para a hipótese de que sucumbiremos em dejetos se nada for feito para reverter o quadro dramático nunca antes vivenciado pela espécie humana. Séria e racional gestão ambiental é a única saída a fim de permitir melhor aproveitamento do Poço Feio.

Desafio do milênio, o desenvolvimento sustentável deve ser encarado como a única saída viável para a continuidade de existência da vida no planeta terra e buscar soluções para problemas locais, primando sempre pela ênfase ao meio ambiente equilibrado, traduz a única forma de legarmos às gerações futuras belezas que a natureza nos disponibiliza e que precisam ser preservadas urgentemente, garantindo ainda a melhoria da qualidade de vida da população através de ações que venham beneficiá-la de forma legítima e duradora.

(*) José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor da UERN. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.

A lenda do Poço Feio

Por José Romero Araújo Cardoso

Existe no Poço Feio, na parte externa, curiosa formação calcária conhecida como "baú da moça", verdadeiro capricho geológico em terreno cretáceo. A natureza talhou primorosamente a estrutura dolomítica a ponto de despertar o imaginário popular, o qual criou lendas acalentadas imemorialmente, elemento importante na aglutinação cultural do lugar.

Reza a tradição passada de geração a geração que em noites de lua cheia uma bela mulher se banha nas águas do Poço Feio. O canto da moça encantada atrai homens que logo se apaixonam e seguem a mulher para o interior da caverna calcária, afogando-se nos túneis ali existentes. A lenda prega que a linda mulher estaria enclausurada no baú calcário, sendo que este se abre quando a lua cheia desponta no horizonte, fazendo-a reviver.

A memória local registra a lenda, a maioria a respeita, não se atrevendo a ir ao Poço Feio em noites de lua cheia, com medo de ser enfeitiçado pela evocação sonora da moça encantada que se banha à luz do luar. Não foram poucas pessoas que me contaram ter ouvido o canto da moça, partido das bandas do Poço Feio.

A riqueza cultural da área correspondente à caverna calcária dix-septiense impressiona pela exponencialidade, pois as formas assumidas pelas lendas imitam congêneres espalhadas Brasil a fora, como a da Iara, também incorporada às tradições indígenas. A lenda do Poço Feio, conforme idôneas personalidades do sítio Bonito, vem antes da colonização lusitana, pois esta seria herança ainda da cultura dos monxorós. No caso, talvez a moça encantada fosse uma índia, não obstante sabermos que diversas estórias fantásticas dos antigos habitantes das Américas incluíssem seres humanos da raça branca, como as existentes nas crenças maia e asteca.

Poucos dix-septienses se aventuram em procurar o Poço Feio quando a lua cheia lança seus raios prateados nas águas de tonalidade azulada do Poço Feio, tem medo da "moça encantada", não se arriscam em desafiar as tradições decantadas em prosa e versos pelos mais velhos.

Em Mossoró, o vanguardismo e a expressão intelecto-cultural de pessoas como o teatrólogo Nonato Santos, diretor do grupo Escarcéu de teatro, assistido pela competente e inteligente companheira Lenilda Sousa, além de outros, incorporaram a lenda do Poço Feio, encenando-a de forma magistral e bem articulada com a cultura local, razão pela qual o grupo Escarcéu é considerado um marco na valorização do folclore riquíssimo da região oeste potiguar.

Na vida real, a verdadeira "moça encantada" pode atender pelo nome de bebida alcoólica, pois não são poucos os registros de fatalidades envolvendo a aventura de adentrar o Poço Feio bêbado, tendo em vista que a caverna é um convite perigoso a desafiar o desconhecido e as incógnitas que marcam a estrutura cretácea dix-septiense.


(*) José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor da UERN. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.


Veja mais em: http://www.sbe.com.br/sbenoticias/SBENoticias_115.pdf