terça-feira, 8 de abril de 2008

Espetáculo das águas leva milhares de pessoas ao Seridó

Por Roberto Fontes
Pra começo de conversa, faltou pastel em Tangará. Sexta-feira, 4 de abril, a exemplo de centenas de conterrâneos do Seridó, peguei minha mulher e os dois filhos e viajei pra conferir a sangria dos açudes e barragens da região. Parei em Tangará – como quase todo mundo que vai naquela direção – e descobri que a peregrinação das águas tinha começado logo cedo. O estoque de pastéis do Veneza estava no fim, devorado certamente pelos conterrâneos que passaram por lá antes de mim.
A minha decisão de viajar foi tomada na véspera, com a notícia ansiosamente aguardada da sangria do açude Itans, em Caicó. Acompanhei a narração da Rádio Rural, gota a gota, via internet. Às 12h24, a água ultrapassou os limites do primeiro sangradouro. A minha euforia se revelou num grito: “sangrou”. João e Bia, meus filhos de 2 e 4 anos, não entenderam nada. Liguei pra todos os conhecidos da lista avisando que o Itans, depois de quatro anos, sangrou de novo.
Só quem nasceu e foi criado no semi-árido, dividindo a angústia provocada pela seca com os pais, irmãos, avós e amigos, tem a exata dimensão do que representa uma invernada boa como a deste ano. A sangria dos açudes e barragens no Seridó e nas demais regiões do semi-árido significa fartura na produção agrícola e babugem pro gado pelo resto do ano. A água, antes escassa, agora é patrimônio acumulado em milhões de metros cúbicos nos vários reservatórios da região.
O nosso circuito das águas começou em Acari. O Gargalheiras, deslumbrante. Fazendo uma analogia com os oceanos, é o Mediterrâneo do Seridó, com seu charme e beleza. Lá degustamos um peixe frito ao som das águas que desciam pelo rio Acauã, observando jovens kamikases que se atiram nas águas da barragem a poucos metros da sangria, desafiando a correnteza. Seguimos por Cruzeta pra ver o açude público. Antes de Caicó, uma parada rápida pra observar o açude São Bernardo, ao lado da pista.
A sangria do São Bernardo vai para o rio Seridó, que nos recepciona na chegada a Caicó. Como nos tempos de menino, o rio estava de barreira a barreira. Barrento. Veloz. O Barra Nova, do outro lado da cidade, também. A euforia do povo de Caicó com o Itans e os dois rios cheios é igual ou superior à de uma Festa de Sant’Ana. O Itans, considerado o Atlântico do Seridó, atrai romarias à sua parede. O fervor do povo com sua sangria é quase religioso. Emociona.
Ainda deu tempo de ver a segunda lavada da Barragem das Carnaúbas, construída em 2002. Parece um véu de noiva. No pé da parede a água desce com força e massageia os banhistas. Tomar banho naquela sangria não tem preço. Domingo, voltamos pra Natal passando por Parelhas. Vimos outra procissão no rumo do Boqueirão, a maior barragem da região, o Pacífico do Seridó. Missa e festa pra comemorar a cheia. O espetáculo das águas de março, por enquanto, é deslumbrante. Mas abril está apenas começando.
Fonte: Tribuna do Norte - 08/04/2008

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