sábado, 5 de abril de 2008

A vez da Natureza.

Por Gustavo Szilagyi

Durante anos o homem tem desafiado a força da "mãe" Natureza e testado sua paciência, e o troco vem sendo dado paulatinamente a cada novo período chuvoso ou a cada seca mais severa.
É claro que o sertanejo, aquele homem simples que não tem instrução, que não teve acesso a educação formal, que tem de matar um leão por dia, de sol a sol, para poder sobreviver aos extremos do sertão nordestino é mais vítima do que culpado por tudo aquilo que nós, os instruídos, temos feito ao nosso meio ambiente, pois somos coniventes com os atos de vandalismo ambiental praticado por empresas e pelo estado a cada dia, sem que nós tenhamos a capacidade de nos manifestar contrários.
As chuvas que estão caindo no nosso sertão, até bem pouco tempo atrás eram vistas como uma benção de Deus, pois estavam possibilitando a cheia dos açudes e a esperança de um ano de boas colheitas na agricultura. Porém, a fé do sertanejo em um ano de boas chuvas não apenas se configurou como uma verdade, como surtiu efeito contrário ao desejo do sofrido homem do sertão, que agora vê sua lavoura sendo lavada pelas águas da tão esperada chuva. Não bastasse sua lavoura, as chuvas estão varrendo do mapa suas casas, sua vida, sua história.
Quantas famílias já não perderam tudo, inclusive a esperança de garantir seu sustento anual com o fruto da colheita de seus roçados?
As fortes chuvas que tem castigado nosso sertão estão nos mostrando, inclusive, outra verdade: à cerca dos anos de degradação ambiental que nós temos promovido sobre nossos mananciais hídricos.
Os rios perderam sua capacidade de drenar as águas que por eles deveriam correr, pois os mesmos estão assoreados. O assoreamento dos canais fluviais possibilita justamente o transbordamento das águas nos períodos de grande invernada (como o atual), com o espraiamente do espelho d'água. A destruição das margens dos rios, com a retirada da mata ciliar, possibilita que cada vez mais, mais material seja carreado para o leito do rio, ampliando seu processo de assoreamento.
Percebemos com isso que todo este pacote de destruição é fruto da falta de cuidado com nossas Bacias hidrográficas.
O prejuízo do sertanejo e do estado é fruto da falta de políticas voltadas à recuperação dos canais fluviais, das matas ciliares dos rios e da ocupação desordenada das áreas de brejo e ribeirinhas. O prejuízo do Estado é retratado na destruição de estradas, pontes, ra rede de energia elétrica, e das adutoras que vão sendo varridas pelas “águas de março”.
Esperamos que este recado da "mãe" natureza, que colocou mais de 30 cidades potiguares em estado de calamidade pública, que tirou a vida de três pessoas e deixou mais de duas mil pessoas desabrigadas, sirva para o Estado perceber que não será a construção de pontes de 165 milhões de reais que evitaram tragédias como esta.
O Estado precisa investir na revitalização de nossas bacias hidrográficas. É preciso recuperar (urgentemente) os rios através da desobstrução dos canais fluviais com investimentos em dragagem e recomposição das matas ciliares.
É preciso que o Estado devolva a dignidade do sertanejo, sendo responsável pelos seus atos, assumindo sua culpa de estado omisso e começando, desde já, a realocação das casas situadas nas chamadas “zonas de risco de inundação” para porções mais elevadas, livres de futuras enchentes. É necessário promover a recomposição da cobertura vegetal das áreas de brejos e das zonas ribeirinhas, e proceder uma forte fiscalização a fim de evitar que novas construções venham a se instalar nestas áreas.
Enquanto estas ações não forem tomadas, ficaremos rezando para que nas próximas chuvas, Deus não seja “tão generoso”.
Fotos: Arquivo Diário de Natal

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